terça-feira, 13 de outubro de 2009

Filme em destaque: O SEGREDO DA MÚMIA

Em 1990, Ivan apavora ao lado de José Mojica e Daniele Daumerie
(Divulgação/O Mestre do Terrir)

Boteco Sujo - Você já disse que pensou em forjar a própria morte para ser reconhecido. O lançamento dessa biografia mostra que você não precisou morrer para que isso acontecesse?

Ivan Cardoso (desvia-se do assunto para falar mal do governo Lula) - Eu poderia dizer que sou uma metamorfose ambulante, mas não vou fazer isso porque o Lula vulgarizou o Raul Seixas, entendeu? O Lula estaria mais para Fagner, uma coisa assim... não vou nem falar que é brega, porque eu gosto muito do Johnny Cash. O Lula não está para porra nenhuma. Está para mentir para a gente, para dizer que o Brasil é intocável da crise. Sabe, a Bolsa de Valores já desabou. No dia em que o Brasil for solução do mundo, é porque o mundo acabou. (Volta para responder à pergunta) Aqui, o artista bom é o artista morto. Graças a Deus eu sempre fiz muito sucesso. Já fiz 60 filmes. Já estou em terra firme, eu não morri na praia. E andei o tempo todo pela contramão com o farol apagado. Eu sou um estrangeiro num país inimigo. Queria ter nascido na Escócia, na Inglaterra ou na Irlanda, num lugar assim mais tranquilo. Aqui é o quintal do Terceiro Mundo. Quem não tiver sapato não sobra. Um país, um cinema que matou Sganzerla não tem luz vermelha.

Boteco - Se você tivesse nascido em outro país, teria uma vida mais tranqüila?

Ivan - Já era rico. Rerrerrê (uma risadinha, curta e sinistra, que Ivan gosta de soltar em determinados momentos). Não precisava aqui ficar vendendo DVD e falando tanta barbaridade. Já estava com o meu boi na sombra. Porque aqui não gostam de cultura, só de falsos artistas. No Brasil, até banqueiro quer ser cineasta. Com o juro a essa altura, como é que o cara pode querer dizer que é artista? Inclusive, no dia em que quiserem fazer um debate, estou à disposição. Podem reunir a tropa de elite toda: os irmãos Salles, o O2, o José Padilha. Todos adeptos da política Bush contra o cinema, contra as drogas e contra o homem. Acabaram com o mundo, acabaram até com o capitalismo. Como é que um banqueiro pode se fingir que é pobre? Isso não existe.

A entrevista completa pode ser conferida no Boteco Sujo

Filme em destaque: O SEGREDO DA MÚMIA


"A Múmia ataca de novo! 3.000 anos depois de ter sido vítima de uma terrível maldição, a Múmia Runamb escapou do seu túmulo nas areias escaldantes do deserto egípcio, para reencontrar o seu verdadeiro amor, em pleno século XX, no coração do Rio de Janeiro e no corpo de uma sedutora jornalista. Fusão criativa dos grandes mitos clássicos do cinema de terror, em particular dos saudosos filmes da Hammer e da Universal, "O Segredo da Múmia" é uma saborosa paródia aos filmes de série B, num cocktail de géneros cinematográficos, com um inconfundível nonsense cinéfilo bem brasileiro e um piscar de olho à estética da banda desenhada. Temperado por um humor às vezes fino, às vezes rasgado e truculento, "O Segredo da Múmia" é um filme emocionante, repleto de aventuras, com uma história romântica de um amor eterno, apimentada com um toque de grande sensualidade e erotismo bem tropicais. Com um lote de actores de onde sobresaem os nomes de Maria Zilda, Felipi Falcão, Tânia Boscoli, Wilson Grey e muitos outros conhecidos actores de novela, "O Segredo da Múmia" foi exibido a concurso no Fantasporto, sendo considerado por muitos como um filme de culto do cinema fantástico brasileiro. Uma grande comédia romântica de terror, de um dos mais populares realizadores brasileiros do género fantástico."

Selecção Oficial Fantasporto'83

Filme em destaque: O SEGREDO DA MÚMIA

"O quê? Uma múmia no Brasil?". Sim, esta é a primeira pergunta que vai fazer qualquer pessoa normal que olhar o título e o cartaz de O SEGREDO DA MÚMIA, um filmaço orgulhosamente brasileiro dirigido em 1982 por Ivan Cardoso - então um reconhecido diretor de curta-metragens, em sua estréia cinematográfica. Injustamente esquecida no país, peça-rara nas locadoras e inédito em DVD (vez por outra passa na TV aberta ou por assinatura, sem grande alarde), O SEGREDO DA MÚMIA é uma daquelas obras-primas do cinema nacional que não podem permanecer na obscuridade.



Para começo de conversa, quem além de um verdadeiro gênio (ou louco) iria pensar no fato de uma múmia atacar no Brasil??? Aquele mesmo Brasil de cenários tropicais e ensolarados, mulheres de pouca roupa e etc.? Convenhamos: múmias combinam mais com os ingleses e suas mansões góticas, seu nevoeiro, ou então com aquelas produções americanas classe B rodadas no Egito.

Entretanto, a visão de uma múmia decrépita caminhando pelas ruas brasileiras em plena luz do dia é um daqueles momentos realmente mágicos, que só mesmo o cinema proporciona. E só isso, esta curiosidade de ver a tal múmia brasileira, já valeria uma olhada em O SEGREDO DA MÚMIA. Mas Ivan Cardoso vai mais além: ele coloca seus personagens principais em uma expedição ao Egito (sendo que o "Egito" é filmado em algum lugar do Brasil), inclui flashbacks mostrando o Egito Antigo de milhares de anos antes de Cristo (que só foram filmados no Brasil, como ainda mostram faraós falando português!!!), entre outras divertidíssimas loucuras. Emprestando o slogan do canal de TV por assinatura Telecine, "isso é cinema!".

E foi justamente esta a frase usada pelo cineasta Samuel Füller (um dos preferidos de Quentin Tarantino, diretor de filmes clássicos como AGONIA E GLÓRIA). Ao ouvir falar sobre um filme brasileiro chamado O SEGREDO DA MÚMIA, Füller espantou-se e declarou, emocionado: "Uma múmia no Brasil? Ah, isso sim é cinema!"



O texto completo, de autoria de Filipe M. Guerra, pode ser lido no bocadoinferno

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Filme em destaque: BANG BANG

Pra quem quiser ter idéia de como é o filme:

Filme em destaque: BANG BANG



"'Eu vejo Bang-Bang como um filme em branco',dizia Andrea Tonacci no debate que a Mostra do Filme Livre proporcionou para o cineasta discorrer sobre sua obra. Mas essa página em branco não é aquela de Mallarmé, mas uma outra, propícia às injunções de um novo estado do cinema brasileiro e à chegada de uma nova geração à realização cinematográfica. Era o desejo de um grupo novo de realizadores que pegava o cinema num momento já codificado demais, extracodificado em suas significações políticas, em seus questionamentos forma/conteúdo, na exaustão do das formas canônicas e, de certa forma, também das modernas do cinema novo. A página em branco, então, não se dá mais por um sentimento de absoluto diante do inexplorado e da pureza do movimento antes do fazer-se da arte, mas pelo esvaziamento deliberado dos moldes de feitura das obras. Na entrevista que dá à Contracampo, Tonacci fala da necessidade de esvaziar o filme, no sentido de lhes retirar o clichê e tornar todos os comportamentos ambíguos.
Mas parece que são apenas dois exemplos de um programa mais geral, que consistiria em renovar o cinema pela negação de tudo aquilo que o cinema já tinha desgastado. Assim como a passagem de Cara a Cara para Um Anjo Nasceu e de O Bandido da Luz Vermelha para A Mulher de Todos, a guinada de Blá-blá-blá para Bang-Bang nasce de uma porta que esses cineastas fecham em relação a um possível diálogo com o cinema de antes. Não é mais tempo para conciliações. É preciso de alguma forma começar do zero. É preciso esvaziar a página."

Trecho do texto de Ruy Gardnier publicado na Contracampo

Filme em destaque: BANG BANG

"O talento excepcional de Andrea Tonacci fez de Bang bang, com suas imagens radicais e inventivas, um verdadeiro filme-laboratório. Durante muito tempo, é a esse filme que todos os experimentadores do cinema no país precisarão se voltar, para nele colher a experiência da liberdade e os variadíssimos ingredientes estilísticos e narrativos que o diretor soube oferecer na forma de cristais puros. A começar da extraordinária fotogenia urbana de Bang bang, que tanto tem a ensinar aos realizadores brasileiros — muitos deles incapazes de filmar suas cidades fora do padrão publicitário telenovelístico. É impressionante que o filme tenha como parte dominante de seu “cenário” a provinciana Belo Horizonte dos anos 1960-70. O modo como Tonacci transforma essa cidade num dos ambientes do cinema moderno brasileiro é um verdadeiro tour de force. Filme construído nos planos, mais que na montagem e no enredo, Bang bang destina à câmera uma autonomia explosiva. A segurança com que ela percorre ruas, invade interiores, segue personagens e também afronta estaticamente a cena é muito, muito humilhante para diretores medianos, que ficam a elucubrar, por minutos, se passam ou não do plano médio para o plano geral."

"Em Bang bang, Tonacci é completa vontade de potência cinematográfica. E, afinal, Bang bang é um filme policial, em tom de sátira, cujos fundamentos provêm tanto das histórias em quadrinhos quanto do cinema burlesco. A narrativa quase não interessa, e mais um pouco até atrapalharia. Importa ao diretor extrair do personagem a sua intensidade visual e reduzir as cenas à condição de puro acontecimento cinematográfico, ou seja: de ilusionismo e catástrofe. Por isso este filme, sempre deliciosamente juvenil, amadurece como um dos documentos por excelência de sua época."

Alcino Leite Neto

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Cia. produtora: Total Filmes

Produção executiva: Luiz Carlos Pires Fernandes

Direção e roteiro: Andrea Tonacci

Fotografia: Thiago Veloso

Montagem: Roman Stulbach

Cenografia: Andrea Tonacci e Milton Gontijo

Elenco: Paulo César Pereio, Jura Otero, Abraão Farc, Ezequias Marques, José Aurélio Vieira, Antonio Naddeo, Milton Gontijo, Thales Penna

Filme em destaque: BANG BANG



Texto que escrevi, tempos atrás, sobre o filme. Prometo algo mais detalhado para as próximas horas.


De acordo com alguns veículos especializados, “Bang Bang” conta a história de um ator de um filme em realização que vive sem conseguir distinguir a sua realidade pessoal da ficção de seu personagem. Busca um sentido e uma saída daquela situação enquanto é perseguido por bandidos, um mágico, uma fantasia amorosa, um bêbado, sua auto-imagem...

... Não que isso importe muito.

Na verdade, para o espectador, isso não faz diferença nenhuma. Nem para o próprio Tonacci, diretor da obra. Para aproveitar o trabalho, saber da sinopse tem o mesmo grau de importância de saber que o Roberto Carlos tem uma perna de metal. Zero.

(E o que é esse filme então?)

Uma página em branco; um trabalho lúdico que convida o espectador a montar uma nova percepção de Cinema; uma tentativa de reorganizar as formas e conceitos sem destruí-los completamente; Hawks sem ser Hawks; uma busca infinita; algo que nunca vou entender completamente; uma experiência válida, para o bem ou para o mal.

Muita coisa pra um filme só.